17.12.07

Olhar de novo


Estava no eléctrico de Lisboa, o 28.
Não sou muito bom (não sou sequer bom) em descrições, mas vou tentar.
Estava eu nesse electrico, e vejo um homem: vestia um fato de macaco verde tropa, usava umas meias brancas e calçava umas sandálias (sim, e era alemão).
Tinha uma altura portuguesa, não falava inglês, mas também não era preciso, era mestre na comunicação.
O melhor de tudo era o cabelo: grisalho, muito grande, e todo no ar, como um verdadeiro "cientista-maluco". Olhava para todas as coisas e todas as pessoas com enorme curiosidade, não lhe escapava cada canto da madeira do eléctrico. Ficava intrigado com os barulhos do motor, que por vezes tentava imitar.
Mas melhor ainda: arrepiava-se cada vez que via uma pessoa triste entrar, e logo arranjava uma maneira de comunicar e por as pessoas a sorrir. Aliás, do pouco que deu para falar com ele, pude perceber que ele achava as pessoas em Lisboa tristes.
À volta dele, tinhamos a impressão de que algo de inteiramente novo estava a acontecer, que tudo era possível, como se estivessemos ali pela primeira vez.
Este homem está na casa dos 50's, e vive assim: inteiramente disponível.
Pensei também em Agostinho da Silva, claro: viver livre, disponivel, e pronto para (quase) tudo, tal como o olhar ladino da uma criança.

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