4.1.08

l´art de la guerre

Com tempo, de saída de banco, respondo ao desafio da Shyz e de um anónimo para tomar parte na guerra que este Guia despertou. Guia onde, segundo Lilia Mahjoub ,"La dépression devient une sorte d’entité fourre-tout où les 'malades' sont incités à consulter leur médecin généraliste pour que celui-ci leur prescrive des antidépresseurs."

Parece-me apenas uma guerra comercial entre associações de pequenos comerciantes (l’Ecole de la cause freudienne, l’Ecole de psychanalyse des forums du champ lacanien.), que em França conservam ainda um forte poder no espaço público (e no espaço privado dos franceses), e a indústria farmacêutica que tenta impor em França, o que já impôs ao resto do mundo, os seus modelos hegemónicos de doença.

Devo dizer que (por enquanto) tenho tanta fé nos princípios neurobiológicos do Stahl como no Édipo de Freud, mas como não sou um homem de fé tenho muito pouca fé em ambos. Os dois campos teóricos parecem-me demasiado interpretativos e com poucos dados empíricos. Ambos se tornam difíceis de validar ou invalidar .Vejo-os por isso como campos teóricos incompletos que necessitam um do outro (e de outros) na tentativa de irmos fazendo senso e pensando racionalmente a prática clínica.

Escapando à guerra entrincheirada (e rentável) dos representantes dos modelos teóricos alguns ensaios clínicos têm sugerido (nomeadamente nos síndromes depressivos) o papel complementar e por vezes mesmo equivalente de abordagens psicofarmacológicas com abordagens de terapia interpessoal (essencialmente cognitivo-comportamental). (1, 2, 3.)
Ao que sei as terapias de base dinâmica não parecem ter tão bons resultados mas claro que também temos que ter em conta a dificuldade que as grandes análises numéricas podem ter com dados tão heterogéneos e subtis como o conceito de transferência e a associação cada vez mais estreita daqueles que fazem investigação em psiquiatria com a indústria farmacêutica.

O guia que despertou a polémica parece-me até bastante equilibrado (e engraçado), respeitando as diversas abordagens e possibilitando um espaço de escolha. Talvez seja isso (as pessoas poderem escolher) o que irritou os psis franceses.

Irrita-me o modelo de doença psiquiátrica que a indústria nos tenta impingir comparando a depressão a uma úlcera e a tristeza a uma epigastralgia. Mas irritam-me também frases como esta da Dra Lilia (tradução livre): “ [em relação à farmacoterapia] É triste suprimirmos a fonte desta depressão, fonte que seria rica em capacidade de transformação e crescimento do sujeito que sofre (...) o ser humano deve falar, dar um sentido àquilo que vive.”

Não será possível respeitarmos os modelos explicativos dos que nos procuram sem tentarmos impor-lhes os nossos?


Nota- ana, se leres isto não me batas por favor, é que eu ainda sou pequenino

3 comentários:

Ana Matos Pires disse...

E eu sou lá capaz de te bater, homem? Ainda por cima concordo contigo e tudo. Pega lá um beijo e prontus.

Shyznogud disse...

e a coisa continua:

http://www.rue89.com/2008/01/06/guerre-des-psys-lanalyse-des-internautes-de-rue89

Patrícia Pascoal disse...

"...o ser humano deve falar, dar um sentido àquilo que vive" grrrggrrr.. pois sim, e se o sentido for em contra-mão, ou no sentido do rio tejo a partir da ponte 25 de abril?