24.5.07

Somos todos migrantes

IRENE KHAN: FREEDOM FROM FEAR
ECRI Annual report

simultaneamente outro e eu mesmo - o Outro. só nele me posso reconhecer, só nele posso identificar e construir aquilo que sou e vou querendo ser. mas esse espelho em abismo permite-me também identificar e construir no outro aquilo que não sou, aquilo que não quero ser, aquilo de que tenho medo. e é isto, como o disse Sartre, o inferno - os Outros. e andamos em constantes migrações - dentro daquilo que vamos sendo e lá fora nos desertos sombrios acossados pela memória destas e doutras perseguições. e os Outros vão sendo sempre os mesmos - o estrangeiro, o pobre, a mulher, o homossexual, o migrante - identidades que não nomeiam pessoas, que dizem apenas aquilo que queremos dizer e silenceiam aquilo que não queremos ouvir. a ameaça está já ali e é real, e por isso não os posso deixar comer à minha mesa, e por isso não lhes posso abrir a porta, e por isso não posso deixar de lhes restringir o movimento, e por isso não os posso deixar conspurcar o meu sangue, e por isso não os posso deixar ser iguais àquilo que não sou. e por isso deixo que o meu medo sirva de pasto a outros filhos-da-puta maiores do que eu, mais capazes de prevenir a ameaça, mais habilitados para a identificar, mais eficazes e sempre prontos a fornecerem-me nova dose de medo sem a qual não sei estar aqui.

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